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Dono da Ferroviária e ex-mecenas do São Caetano é acusado de estupro por 14 mulheres

Filho de Saul Klein rompeu com o pai. Defesa sustenta que o empresário é um sugar dady e
que não há crime. Repórter Rodrigo Viana mostra outros detalhes exclusivos do caso

Saul Klein tem participação majoritária na Ferroviária (Foto: Divulgação/Prefeitura de Araraquara)

Rodrigo Viana* – Especial para o LANCE!
 23/12/2020
 10:56
São Paulo (SP)

O filho do fundador das Casas Bahia, Saul Klein, entregou o passaporte à Justiça e está proibido de ter contato com 14 mulheres que o acusam de aliciá-las e estuprá-las em festas que reuniam dezenas de garotas em sua mansão, em Alphaville, desde 2008. Saul Klein é filho de Samuel Klein, fundador das Casas Bahia que faleceu em 2014. Ele atualmente disputa a herança do pai na Justiça com o seu irmão mais velho Michel Klein, para quem Saul vendeu a sua parte societária na rede varejista em 2010. Especula-se que a venda tenha sido na casa dos 5 bilhões de reais. Pra se ter uma ideia da fortuna dos irmãos, Michel Klein foi listado em 2015 entre os 50 maiores bilionários do Brasil pela revista Forbes.

Saul Klein é o dono da Ferroviária de Araraquara – tem 51% das ações do clube e todo o Conselho Deliberativo, o que dá a ele um poder supremo nas decisões. Inclusive sobre o Departamento de Futebol Feminino, considerado pela Conferência Brasileira de Futebol, como o melhor do país.

No ano passado, a Ferroviária foi bicampeã brasileira, sendo a única equipe a ter dois títulos na competição, além de vice-campeã da Libertadores e vice-campeã Paulista no último domingo. Também tem ótimas campanhas nas equipes Sub-14, 16 e 17, com jogadoras na Seleção Brasileira em quase todas essas categorias. As chamadas ‘Guerreiras Grenás’ descobriram, agora, que tem um chefe acusado de estupro e aliciamento de mulheres, algumas menores de idade.

Mecenas do São Caetano e tentativa de entrar na política
Ele também foi – por mais de 20 anos – o mecenas que levou o São Caetano à proeminência do futebol nacional no final dos anos 90 e início de 2000. Foram milhões. Segundo o próprio Klein, ele teria doado R$ 80 milhões ao time do ABC. O empresário também foi candidato (não eleito) a vice-prefeito de São Caetano do Sul neste ano. Um homem poderoso.

Relações cortadas com o filho
O filho de Saul, Philip Klein, falou, com exclusividade, ao jornalista Rodrigo Viana. Afirmou estar com as relações cortadas com o pai. A razão seria as ingerências de Saul na Ferroviária, onde Philip atuava como Diretor Financeiro:

– As decisões eram tomadas somente por ele, isso atrapalhou muito. Tudo feito na emoção, sem racionalidade. Um erro, disse um amargurado Philip.

Saul Klein acusado de estupro
Philip diz estar com as relações cortadas com o pai (Foto: Divulgação)

O erro e a desavença com o filho parecem ter sido o prenúncio das acusações de estupro e aliciamento contra Saul Klein. (o fato ficou público na noite de segunda-feira na coluna de Mônica Bergamo, na Folha de S. Paulo).

O Ministério Público de São Paulo quer garantias para o andamento da investigação das denúncias, que estão mantidas em segredo de Justiça em um inquérito policial aberto na Delegacia de Defesa da Mulher de Barueri. Em julho, a polícia arquivou outro inquérito com alegações semelhantes e que apurava a suposta exploração sexual de uma menor de idade por Klein. Dessa vez parece que o buraco é mais embaixo.

‘O sr. Saul Klein vem sendo vítima de um grupo organizado que se uniu com o único objetivo de enriquecer ilicitamente às custas dele, através da realização de ameaças e da apresentação de acusações falsas em âmbito judicial, policial e midiático’

A defesa do empresário diz que o seu cliente é um ‘sugar daddy’ – termo que descreve homens que têm fetiche em sustentar financeiramente mulheres jovens em troca de afeto e sexo, mas alega que ele jamais cometeu os crimes apontados pelas vítimas.

– O sr. Saul Klein vem sendo vítima de um grupo organizado que se uniu com o único objetivo de enriquecer ilicitamente às custas dele, através da realização de ameaças e da apresentação de acusações falsas em âmbito judicial, policial e midiático – disse o advogado André Boiani e Azevedo, que representa Klein, à Folha de S. Paulo.

– Várias dessas pessoas já conseguiram se aproveitar dele em outras oportunidades, causando-lhe prejuízo milionário, e estavam acostumadas a essa situação. Quando perceberam que esse tempo acabou, passaram a difamá-lo publicamente – segue Azevedo.

– Ele (Saul) sente profunda indignação diante desse quadro, mas se defenderá com toda a tranquilidade, pois tem absoluta confiança na polícia, no Ministério Público e no Poder Judiciário, que já atestaram sua inocência em investigação anterior e certamente o inocentarão mais uma vez.

O advogado afirma que o seu cliente contratava uma agência que lhe trazia sugar babies – como são chamadas as garotas que se dispõem a serem bancadas pelos daddies – e que ele mantém diversos relacionamentos simultaneamente.

– Ele era o daddy de todos os daddies, do qual todas as babies gostariam de ser babies – contou Azevedo.

Azevedo aponta que os ataques têm por objetivo chantageá-lo e achacá-lo desde 2019, quando Klein parou de adquirir o serviço da empresa que lhe apresentava as mulheres, por desconfiar que os seus proprietários estavam tentando extorqui-lo.

Apoio do Staff
Funcionários e parceiros de Saul Klein parecem ter adotado a narrativa dos advogados. Marcelo Santoro é o MS, da “MS Sports”, braço esportivo que atende aos interesses de Klein e com a qual a Ferroviária tem a parceria firmada. Em uma rede social, ele postou:

– E as mulheres que recebiam para isso? Tá claro que elas eram muito bem pagas para estar onde estavam. Tá claro que era uma troca. Para mim é típico caso de chantagem e extorsão. Vamos aguardar o julgamento.

Logo depois de escrever, Santoro apagou a postagem.

Mas os relatos das 14 vítimas são fortes. A promotoria paulista solicitou à Justiça medidas restritivas para que o empresário não deixe o país nem contate as mulheres que o acusam. O pedido foi acatado pela 2ª Vara Criminal da comarca de Barueri.

“Segundo constou do requerimento, todas as mulheres acima foram vítimas de aliciamento sexual”, aponta o despacho da Justiça citando informações elencadas pela promotoria. “Eram procuradas por aliciadores em redes sociais e outros canais, informadas falsamente de que havia interesse na contratação delas por parte de uma empresa e conduzidas a uma apresentação, a título de teste, para o requerido Saul”.

“Os testes eram feitos em um flat e elas tinham que usar biquínis ou roupa íntima. Elas eram convencidas de que, se satisfizessem a lascívia do requerido Saul, poderiam ser contratadas para eventos na mansão de Alphaville, quando então receberiam de mil a três mil reais, ou numa casa de campo dele em Boituva”, segue a narrativa.

“Nesses eventos, que podiam contar com 15 a 30 moças, elas tinham que exibir o tempo todo de biquíni e submeter-se a atividades sexuais com o requerido Saul, inclusive de modo humilhante e a contragosto. Também podiam ter que ingerir droga, permanecer trancadas em um quarto por um dia inteiro e aceitar se submeter a consultas com médicos ginecologista e cirurgião plástico, respectivamente, para cuidar das persistentes e reiteradas doenças sexualmente transmissíveis que as acometia e de outras enfermidades que apresentaram, bem como receber aplicações de botox ou outros tratamentos destinados a prepará-las para as sessões com o requerido Saul”.

“Salientou o Ministério Público que o fato de que as propriedades sempre eram vigiadas por seguranças armados e que as mulheres eram submetidas a atos de brutalidade e de humilhação, exemplificando com cusparadas. Telefones celulares normalmente eram confiscados quando da chegada delas ao local”, cita o despacho. “Em razão da constante exploração, da dependência econômica, do subjugo físico e da intimidação moral, muitas mulheres adoeceram e uma delas chegou a se suicidar”.

“Foi realçado, ainda, o fato de que eram providenciados documentos falsos às mulheres, com nomes e demais dados alterados, o que era especialmente importante para as adolescentes”, emenda o documento sobre acusações sobre a possível relação de Saul com menores de idade.

“(Elas também disseram que) eram ameaçadas a não tratar do que ocorria nesses locais com quem quer que fosse, sob pena de sofrerem consequências”, continua.

Conversa com as vítimas
A reportagem da Folha conversou por telefone com duas das alegadas vítimas que acusam o empresário. Uma conheceu Saul em 2008 e conviveu com ele até este ano. A outra começou em 2013. Nenhuma delas quis se identificar, alegando que não querem ser expostas e que têm medo de represálias do empresário. Elas corroboram os relatos elencados na decisão judicial. Uma terceira suposta vítima desistiu de falar com a reportagem.

O advogado de Saul Klein aponta que a relação criada entre o empresário e as mulheres nem sempre acarretava em atos sexuais, mas que quando isso ocorria era consensual. Ele afirma que o empresário dava presentes a elas, mas que ele nunca fez pagamentos às suas amantes e não participava desta negociação – quem tratava disso era a agência, que também se responsabilizava por verificar as idades de todas as garotas para que fossem maiores de idade. Também alega que a menor de idade que se envolveu com ele apresentou documento falso porque queria ser admitida nos eventos de Saul.

A advogada Gabriela Souza, que representa as vítimas, afirma que só se manifestará em janeiro. A investigação segue em segredo de Justiça.

Entramos em contato com a assessoria de Saul Klein que disse que só se manifestará sobre o caso através dos advogados. Eles não foram encontrados.

A Ferroviária, time do qual Klein é o sócio majoritário, divulgou uma comunicado na tarde desta quarta-feira. Leia a mensagem na íntegra:

“Em relação à divulgação de acusações contra o empresário Saul Klein, a Ferroviária Futebol S/A comunica que aguardará pelas manifestações oficiais da Justiça acerca das investigações a serem realizadas pelos órgãos competentes.

A instituição se manifestará exclusivamente por seus canais oficiais de comunicação.”

Nota atualizada às 14h52

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*Rodrigo Viana nasceu em Ilha Solteira (SP), mas adotou Araraquara como cidade natal. Jornalista e Mestre em Estudos Literários, pela Unesp, foi professor de pós-graduação em Jornalismo Esportivo e Novas Mídias. Também foi colunista da Revista Imprensa e deste LANCE!. Ministrou palestras e workshops em parceria com a Sociedade Brasileira de Estudos Interdisciplinares da Comunicação – Intercom. Em 2013, lançou, no Museu do Futebol em São Paulo, o livro “A Bola e o Verbo – o futebol na crônica brasileira”, pela Summus Editorial.

Foi jogador das categorias de base da Ferroviária e integra a Seleção Brasileira de futebol dos escritores, o ‘Pindorama’, projeto que une Literatura e Futebol. Trabalhou em todas as grandes emissoras de TV do pais, com destaque para a cobertura da Copa do Mundo de 2014 pelo Sportv/Globo e o título mundial do Corinthians em 2012, no Japão, pelo SBT. Também denunciou o esquema de venda de ingressos pela Fifa na Copa das Confederações em 2013.

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